16 de ago. de 2011

E eu preciso de você, mas e depois?

E eu te deixo, mas e depois?

Talvez devesse sorrir, ainda que ferida; talvez devesse chorar, só para variar, ou desabar nos braços de quem pudesse lhe segurar. Mas não havia nada que devesse fazer que realmente conseguisse. Não tinha vontade de fazer nada. Com os olhos fechados conseguia sonhar que nada daquilo era real, que não passava de um sonho macabro, que sua mente era terrivelmente incontrolável. Queria que suas ilusões engolissem o tempo, acabassem com as dúvidas, fechassem as feridas. Mas seus olhos estarem fechados não mudava o fato de que seu coração nunca estivera tão estraçalhado. Desde menina tivera sonhos simples, lembranças de um conto de fadas que nunca vivera. Apesar de cuidadosa, sonhava alto; apesar de parecer fria, sua sensibilidade ultrapassava os limites saudáveis; apesar do pessimismo aparente, esperava que tudo desse certo. Seu erro era fingir ser sua própria fortaleza. E então, quando deu por si, estava apaixonada.

Não pelo príncipe encantado nem pelo homem certo. Não pelo garoto dos seus sonhos nem por alguém que merecia esse amor. Alguém que estava ao seu lado, alguém que tinha mil defeitos; ela conhecia todos. Isso era ainda mais triste. Conhecendo-o tão bem, conhecia as impossibilidades. E as brincadeiras a feriam devastadoramente; quase acreditava e o tombo era sempre grande demais.

"O que, eu minto tão mal?" - ele sorria ao perguntar.
Percebi a mentira através do seu olhar - queria dizer e, no fim, nada dizia.

Já não podia mais fingir, ou podia? Conseguiria olhá-lo todos os dias nos olhos como se não sentisse nada? Como se seu coração não saltasse de medo, dor e paixão? Tudo bem, seguiria, um dia tudo isso passaria. Mas e então? Até quando teria que lidar com aquele vão no peito? Até onde seria capaz de ir com aquele grito preso na garganta, com as silenciosas declarações de amor?

Nem todos aguentam mentiras e eu ignoro isso, mas e depois?

Fugir não a levaria a lugar nenhum porque não tinha para onde fugir. Aquele sentimento não devia existir, aquela vontade de ser a única para ele não devia existir, aquele brilho no olhar não devia existir. E, no entanto, como se fosse de propósito, existiam. Ninguém acreditava neles, ninguém imaginava. O assustador era a certeza de amá-lo e não poder amar. Procuraria outros amores, talvez, ou outras maneiras de esquecê-lo. Lutar contra o mundo todo, no entanto, seria um milhão de vezes mais fácil do que lutar contra si mesma.

Talvez depois eu vá embora para sempre.

Música: Brush it off - Plan Three.
Conto para Projeto Blóinquês.

7 de ago. de 2011

:

‎"É como se a vida dissesse o seguinte:
e simplesmente não houvesse o seguinte.
Só os dois pontos à espera."
Clarice Lispector


Preencher o sentido dos dois pontos parece ser o motivo pelo qual vivemos. Quero que a vida me diga alguma coisa, quero que haja um sentido certo para acordar todos os dias. E eu digo tantas coisas à vida; crio um monólogo. Ela nunca responde. Cada dia que passa, em cada momento vivido, procuro palavras nas circunstâncias, nas coincidências, nas minhas próprias vontades, nas supostas verdades. Mesmo que sejam perguntas, ainda assim a vida parece querer dizer algo que nunca diz. Ela nunca dirá? Porque às vezes canso de tentar decifrar esses códigos bobos que não significam nada.

E quando tudo o que sinto é que falta algo, volto a procurar. Procuro, procuro até cansar, e de novo, e de novo. Nunca encontrei nada, nunca soube se a sensação que tenho é real ou se não passa da minha vontade imensa de entender o mundo. E parece que perco quando não entendo o que a vida quer me dizer. Ouço ela gritando e nada. E ainda assim ela segue frisando, aos berros, aqueles dois pontos que eu preciso entender; deve ser só para me provar a importância das minhas perguntas.

Pensando bem, poderiam ser pontos de exclamação, reticências, pontos de interrogação, vírgulas e até mesmo pontos finais. Mas são esses dois pontos que me matam: eles ilustram a possibilidade de ser qualquer coisa.