29 de mai. de 2011

Nunca quis

Nunca quis ser a sombra de alguém. Nunca quis dever, ser enganada, errar. Não quis misturar as coisas, não quis dividi-las. De jeito nenhum quis ser fria, realista demais, prática. Fico feliz de ter descoberto algumas verdades, mas nunca quis que elas existissem. Não quis saber, de todo o modo, mais do que deveria. Não quis ter certeza de coisas assustadoramente reais.

Não quero esperar a morte, não quero afastar pessoas, não quero ser engraçada demais ou séria demais, também. Nunca tive a intenção de quebrar corações nem de ser machucada. E seria hipocrisia dizer que nunca quis vingança, porque eu quis, eu quero. Eu não quero dúvida, de qualquer modo. Não quero esse sentimento de aperto no peito, tudo isso que acontece quando a gente não sabe como sair de uma situação incômoda. Nunca quis essa pressa, o tempo passando sem eu sequer perceber, as pessoas vindo, indo e voltando como se fosse simples assim, como se não devessem nada a ninguém, como se não devessem nada pra mim. Eu quis dizer muitas coisas que não disse, mas queria poder nunca ter dito outras. Eu nunca quis não conseguir amar. Não queria ser tão fechada, talvez até vazia. Mas também nunca quis ser a boba que ama tanto alguém que esquece de se amar. Nunca quis me aproveitar das fraquezas de ninguém porque nunca quis sabê-las. 

Não quis brincar que os contos de fadas são reais. Não quis que fosse uma brincadeira. E, acima de qualquer outra coisa, eu nunca quis arrependimentos. Então, como prioridade máxima, não me arrependerei. Que seja bom e que acabe antes de se tornar ruim. Que acabe para poder começar tudo de novo.

Tenho medo de já ter perdido muito tempo. Tenho medo que seja cada vez mais difícil. Tenho medo de endurecer, de me fechar, de me encarapaçar dentro de uma solidão-escudo. 
Caio Fernando Abreu

22 de mai. de 2011

Perdemos

Summer turned to winter
And the snow had turned to rain
And the rain turned into tears upon your face


O tempo todo. Perdemos o medo, perdemos a coragem, perdemos o sono, perdemos tempo, perdemos a vontade, perdemos sentimentos, perdemos olhares, detalhes, perdemos chances, perdemos oportunidades e perdemos pessoas. Perdemos coisas que importam e coisas que já vão tarde, perdemos sorrisos e lágrimas, perdemos filmes, perdemos livros, perdemos a fala, perdemos o ritmo... Perder é uma constante, é uma regra da vida. Mas ganhamos tanto, ganhamos o tempo todo, também. Ganhamos sabedoria, ganhamos momentos únicos, ganhamos lembranças, ganhamos ânimo, felicidade. Ganhamos o dia, a noite, a semana inteira, o ano! Ganhamos algo, ganhamos de alguém, ganhamos tanto, tanto, e perdemos tudo isso. Porque a última coisa que perdemos é a vida. A vida é assim, ela dá coisas e as tira de nós porque somos suscetíveis, somos vulneráveis, somos seu brinquedo.

A vida brinca. Ganhamos a vida e esse é o melhor presente. Perdemos a vida e esta é a nossa maior lástima. Nosso maior medo, perder mais do que ganhar, perder antes de ganhar tudo o que se pode, não conseguir lutar mais pelo que queremos pelo simples fato de perdermos tudo. O chão, o show. Mas ganhamos, antes disso, é claro, muitas outras coisas que não morrem, que não perderemos tão cedo. Alguns perdem e outros ganham, mas às vezes só há perdas. Não há beleza na morte. A morte é triste, não há nada mais triste do que perder. E ninguém ganha essa guerra. Sempre perderemos.

Life can show no mercy
It can tear your soul apart
It can make you feel like you've gone crazy
But you're not

Mas ganhamos, não ganhamos? Quando perdemos algo, é porque esse algo era nosso, nos foi dado, nos foi concedido, nos foi oferecido. Então perder tem lá seu lado bom, no fim das contas... Porque tivemos. Tivemos e, tudo bem, perdemos, mas o que tivemos e uma vez foi nosso só se apagará de nossas memórias quando já não existirmos. E todas as coisas boas que "o que" ou "quem" perdemos nos trouxe quando nos pertenceu ameniza, levemente, a dor de termos perdido. As lembranças são o que nos leva para frente. E a vontade de ter mais lembranças faz com que vivamos, dia após dia, mesmo sabendo que vamos perder.

Se sentimos falta, se realmente perdemos, é porque foi lindo. E sempre será lindo. Estaremos sempre procurando a beleza que queremos ver, o sentimento que queremos sentir. Nunca desistiremos até que, inevitavelmente, nos percamos de nós.

Foto por ~Aegis13 em www.deviantart.com

Música: Lost - Michael Bublé

14 de mai. de 2011

~

As máscaras continuam lá. Como se ninguém nunca tivesse visto realmente seus rostos. Como se fossem incógnitas para todos, quando são, na verdade, livros abertos, livros ruins. Talvez as máscaras caiam um dia, talvez permaneçam lá até se tornarem faces.


Vivem numa mentira. Querem que seja verdade. São uma mentira. E quem é de mentira não se torna real.